Prof. Dr. Hiran Roedel
Um olhar sobre a cidade do Rio de Janeiro na modernidade impõe a observação de algumas questões preliminares. O primeiro aspecto a ser levado em consideração é entender modernidade como a experiência histórico-social do capitalismo. Uma conjuntura revolucionária marcada, situando historicamente, até inícios da segunda metade do século XIX, pelo conflito entre burguesia urbana e aristocracia rural. Sob esse ponto de vista, as novas relações socioculturais desembocam, também, na reorganização e inovação dos padrões de sociabilidade. Leia mais.
As necessidades de ampliação e reprodução do capital que elegem o mercado como parâmetro para a organização social, estabelecem como característica a organização sócio-espacial hierarquizada por critérios de classe. Sua estruturação obedece os critérios funcionais que possibilitam a integração e circulação de seus habitantes de modo a atender aos requisitos do capital.
No Brasil, essa concepção de modernização do espaço urbano chega após a proclamação da República, em início do século XX, no Rio de Janeiro. Conjuntura que dava sinais da emergência de dois novos atores políticos e que marcariam progressivamente o cenário brasileiro: burguesia industrial e operariado.
Modernizar é então entendido por organizar o tecido urbano de acordo com as exigências do capital, viabilizando a circulação dos novos meios de transporte. Um movimento que buscou subjugar os traços coloniais produzindo referenciais ancorados na intensificação das relações pautadas pelo mercado. Largas avenidas foram abertas, as camadas populares removidas da área central e empurradas para a periferia ou para os morros. Um porto foi construído em substituição aos trapiches e assim o país, através do Rio, se atualizava incorporando os paradigmas do capitalismo internacional.
Sintonizado com as possíveis mudanças da ordem sócio-econômica mundial, algumas outras intervenções pontuais foram realizadas ao longo dos tempos buscando sempre acompanhar as novas exigências impostas por um capitalismo que apostava cada vez mais no frenesi do consumo e da circulação. Se adequar e incorporar as mensagens enviadas do “centro” do capitalismo, também é acompanhar o deslocamento das concepções de organização e administração do espaço urbano de uma perspectiva europeizante, francesa em sua essência, para a perspectiva norte-americana. Mais do que nunca, a via de circulação passa a ser entendida como o espaço do automóvel, significando o aprofundamento gradativo da privatização do espaço público.
A década de 1950 é emblemática nesse processo, pois corresponde ao ingresso do capital das indústrias automobilísticas no país. O Rio, como capital federal e logo em seguida como estado da Guanabara, permanece acompanhando, em posição de destaque, as tendências originadas e difundidas pelo capitalismo central.
É sob essa perspectiva que, a partir dos anos 90, se busca preparar a cidade para participar do circuito da globalização, mediante intervenções e administração orientadas pela racionalidade da organização empresarial no trato das questões urbanas, ao mesmo tempo que lhe disponibiliza infra-estrutura tecnológica para lhe possibilitar a integração à rede mundial. Nesse aspecto, tanto o projeto do Teleporto quanto a concepção de organização e expansão da Barra da Tijuca respondem simbólica e materialmente ao paradigma urbanístico oferecido de forma hegemônica pelo capitalismo da globalização.
A preocupação em se atualizar reforça, assim, a tendência excludente característica das relações capitalistas e impõe às classes populares um deslocamento constante para as áreas periféricas. Uma tendência que se firmou quando do avanço dessas relações na cidade e cuja presença do poder público nas áreas de exclusão se faz, prioritariamente, pelos mecanismos de coerção.
As condições objetivas ao contribuírem para organizar, na periferia, uma rede de produção simbólica que estrutura os laços de pertencimento, o faz, no entanto, em condições subalternas aos padrões civilizatórios ditados pelas classes e/ou frações das classes dominantes. Não se quer dizer, contudo, que tais produções simbólicas não se formem em condições de possibilidade de relativa autonomia. É isso que exige a utilização de outros mecanismos de controle. Pelo poder público age-se, entre outros, através do aparato repressor do Estado, enquanto que pelo poder econômico a mídia constitui-se em eficaz aparelho de construção do consenso. Ambos compõem um conjunto maior de mecanismos responsáveis por persuadir as classes populares da “justeza” da estrutura social. A “fragilidade” dos laços de pertencimento que caracterizam essas comunidades contribui para dar força aos enunciados performáticos da mídia, pois consolida a atomização dos indivíduos sucumbindo-os ao poder hegemônico da lógica do capital.
Romantizar ou criminalizar a pobreza foi o jogo de enunciação adotado pelas elites para, de um lado, integrar essas classes ao tecido social urbano e, por outro, mantê-las sob rígido controle. Mas, finalmente, olhar a cidade pela ótica da racionalização empresarial tende a desconsiderar as contradições geradas pelo próprio mercado, espaço eleito pelo capital para a realização das experiências societárias. Busca anular a força dinâmica de transformação histórica ao reprimir o diálogo entre concepções políticas, muitas vezes antagônicas, mas que são imprescindíveis para apontar alternativas.
No Brasil, essa concepção de modernização do espaço urbano chega após a proclamação da República, em início do século XX, no Rio de Janeiro. Conjuntura que dava sinais da emergência de dois novos atores políticos e que marcariam progressivamente o cenário brasileiro: burguesia industrial e operariado.
Modernizar é então entendido por organizar o tecido urbano de acordo com as exigências do capital, viabilizando a circulação dos novos meios de transporte. Um movimento que buscou subjugar os traços coloniais produzindo referenciais ancorados na intensificação das relações pautadas pelo mercado. Largas avenidas foram abertas, as camadas populares removidas da área central e empurradas para a periferia ou para os morros. Um porto foi construído em substituição aos trapiches e assim o país, através do Rio, se atualizava incorporando os paradigmas do capitalismo internacional.
Sintonizado com as possíveis mudanças da ordem sócio-econômica mundial, algumas outras intervenções pontuais foram realizadas ao longo dos tempos buscando sempre acompanhar as novas exigências impostas por um capitalismo que apostava cada vez mais no frenesi do consumo e da circulação. Se adequar e incorporar as mensagens enviadas do “centro” do capitalismo, também é acompanhar o deslocamento das concepções de organização e administração do espaço urbano de uma perspectiva europeizante, francesa em sua essência, para a perspectiva norte-americana. Mais do que nunca, a via de circulação passa a ser entendida como o espaço do automóvel, significando o aprofundamento gradativo da privatização do espaço público.
A década de 1950 é emblemática nesse processo, pois corresponde ao ingresso do capital das indústrias automobilísticas no país. O Rio, como capital federal e logo em seguida como estado da Guanabara, permanece acompanhando, em posição de destaque, as tendências originadas e difundidas pelo capitalismo central.
É sob essa perspectiva que, a partir dos anos 90, se busca preparar a cidade para participar do circuito da globalização, mediante intervenções e administração orientadas pela racionalidade da organização empresarial no trato das questões urbanas, ao mesmo tempo que lhe disponibiliza infra-estrutura tecnológica para lhe possibilitar a integração à rede mundial. Nesse aspecto, tanto o projeto do Teleporto quanto a concepção de organização e expansão da Barra da Tijuca respondem simbólica e materialmente ao paradigma urbanístico oferecido de forma hegemônica pelo capitalismo da globalização.
A preocupação em se atualizar reforça, assim, a tendência excludente característica das relações capitalistas e impõe às classes populares um deslocamento constante para as áreas periféricas. Uma tendência que se firmou quando do avanço dessas relações na cidade e cuja presença do poder público nas áreas de exclusão se faz, prioritariamente, pelos mecanismos de coerção.
As condições objetivas ao contribuírem para organizar, na periferia, uma rede de produção simbólica que estrutura os laços de pertencimento, o faz, no entanto, em condições subalternas aos padrões civilizatórios ditados pelas classes e/ou frações das classes dominantes. Não se quer dizer, contudo, que tais produções simbólicas não se formem em condições de possibilidade de relativa autonomia. É isso que exige a utilização de outros mecanismos de controle. Pelo poder público age-se, entre outros, através do aparato repressor do Estado, enquanto que pelo poder econômico a mídia constitui-se em eficaz aparelho de construção do consenso. Ambos compõem um conjunto maior de mecanismos responsáveis por persuadir as classes populares da “justeza” da estrutura social. A “fragilidade” dos laços de pertencimento que caracterizam essas comunidades contribui para dar força aos enunciados performáticos da mídia, pois consolida a atomização dos indivíduos sucumbindo-os ao poder hegemônico da lógica do capital.
Romantizar ou criminalizar a pobreza foi o jogo de enunciação adotado pelas elites para, de um lado, integrar essas classes ao tecido social urbano e, por outro, mantê-las sob rígido controle. Mas, finalmente, olhar a cidade pela ótica da racionalização empresarial tende a desconsiderar as contradições geradas pelo próprio mercado, espaço eleito pelo capital para a realização das experiências societárias. Busca anular a força dinâmica de transformação histórica ao reprimir o diálogo entre concepções políticas, muitas vezes antagônicas, mas que são imprescindíveis para apontar alternativas.
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