I Semana do Rádio :: 2003/1

Por que o Rádio? Há 80 anos, quando Edgar Roquette Pinto realizou a primeira transmissão de sua Rádio Sociedade do Rio de Janeiro, é muito provável que ele não tenha imaginado até onde isso ia chegar. Talvez ele nunca tenha pensado que o rádio pudesse ser usado como veículo de divulgação ideológica, que viesse a fazer parte da vida esportiva nacional, que parasse o país no último capítulo de uma novela, ou que fosse levar pessoas engajadas no exercício da profissão para cadeia, justamente pelo fato de exerce-las. Mas o rádio proporcionou tudo isso e muito mais.

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Em sua história, o meio já passou por momentos áureos, quando tudo aquilo que era importante para sociedade vinha do rádio. Mas desde o surgimento da televisão, nada mais foi o mesmo. As pessoas aprenderam uma nova linguagem e o rádio teve de se reciclar. De lá pra cá, uma fonte inesgotável de experiências vêm sendo produzidas para preservação do meio. Algumas comerciais, outras nem tanto e um grande número de experiências com o único objetivo de difundir a informação.

Não é muito complicado entender como um aparelho de transmissão funciona, mas compreender a linguagem, como uma mensagem radiofônica é produzida, é bem mais complexo. As rádios brasileiras têm trabalhado bastante com a segmentação. Atender a um determinado nicho do mercado foi o melhor caminho encontrado para sobreviver. Mas o que dizer de experiências como a rádio Interferência, dos alunos de Comunicação da UFRJ, que colocavam em prática seus conhecimentos teóricos sem se preocupar com o mercado?

Assim como em outros meios de comunicação, o controle também afeta o rádio e compromete a sua mensagem. A democratização dos meios de comunicação não é apenas um movimento que pretende modificar leis, mas sim, abrir caminhos e espaços para que novas experiências possam ser realizadas. A interatividade e a simultaneidade que o rádio propicia são extremamente importantes para o estudo da comunicação. E é com o objetivo de conhecer melhor esse meio, que nós, do PET ECO, organizamos esse encontro com acadêmicos e profissionais ligados ao rádio. Bem Vindos à 1a Semana do Rádio.

Túnel do Tempo

Em 7 de setembro de 1922, em uma exposição comemorativa do Centenário da Independência do Brasil, ocorreu a primeira transmissão oficial registrada no país. A Westinghouse cedeu equipamentos que possibilitaram o presidente Epitácio Pessoa fazer um pronunciamento à Nação. Sete meses depois, em 20 de abril de 1923, empolgado com a experiência inédita, Edgar Roquette Pinto fez a primeira transmissão da Rádio Sociedade do Rio de Janeiro, e pelo enorme trabalho realizado foi considerado o pai do Rádio no Brasil. Tempos depois, Roquette-Pinto vendeu a emissora para o Ministério da Educação, e esta veio a se chamar Rádio MEC.

“Pela Cultura dos que vivem em nossa terra e pelo progresso do Brasil”
Slogan da Rádio Sociedade do Rio de Janeiro


A segunda estação de rádio surgiu em 1924. Por motivos técnicos, a Rádio Clube do Brasil teve de dividir o tempo da transmissão com a Rádio Sociedade. Apesar de todos os problemas, financeiros e técnicos, o rádio se difundiu pelo país. Aos poucos, foram inseridas as propagandas comerciais e a venda de horários, o que possibilitou um retorno financeiro capaz de alavancar a qualidade da programação.

Um bom exemplo foi o Programa do Casé, surgido em 1932, que trazia variedades, revelou talentos e músicas de excelente nível. Tinha em seu quadro nomes como Carmem Miranda, Lamartine Babo, Noel Rosa entre outros. Os pedidos dos ouvintes eram executados ao vivo. "Criando uma estrutura comercial para o rádio, ele revolucionou a história da propaganda, com jingles e peças publicitárias", observa o pesquisador Humberto Franceschi.

Com o passar do tempo, a profissionalização e o desenvolvimento técnico do meio, a venda de receptores aumentou. O rádio se tornou o veículo das massas, e as emissoras começaram a disputar a preferência popular. Um dos recursos foi a diversificação da programação, daí surgiram: as transmissões esportivas, com jogos de futebol e corrida de cavalos; os programas humorísticos; as radionovelas; e os programas de calouros. Nas décadas de 40 e 50, as mais efervescentes do rádio brasileiro, os destaques foram o Repórter Esso, a Rádio Nacional e o seu mais famoso programa de auditório, o Programa César de Alencar.

Durante o período populista, as rádios ficaram encarregadas de realizar a integração nacional. Trazer o brasileiro para a vida urbana. A política usou a força do rádio para transmitir suas ideologias. E durante os períodos mais duros da repressão, os estúdios foram mantidos sobre vigilância constante, pois simples palavras ditas diante de um microfone poderiam gerar sérias conseqüências em alguma região do país.

O surgimento da televisão obrigou o rádio a se adaptar a uma nova realidade, na qual o meio não dispunha mais de tantos privilégios. É bem verdade que o rádio ainda é o meio mais popular e de maior alcance, com maior número de emissoras e que está mais presente no cotidiano das pessoas. Todavia, o presente tem se mostrado muito mais difícil do que parece. A nova geração cresceu acostumada a receber informações através de imagens, cada vez mais velozes. A vantagem da interatividade com o ouvinte está comprometida com as possibilidades abertas pela Internet.

O resultado já vem sendo sentido a algum tempo. Não existem mais rádios grandiosas como a Nacional, cheias de artistas, talentos e profissionais atuando num espetáculo diário. Hoje em dia, as rádios funcionam com uma equipe pequena e sem dispor de tantos recursos.

Apesar dos seus trunfos, o rádio aguarda ansiosamente pela era digital. As modificações proporcionadas pela digitalização são fundamentais para manutenção do meio: som de qualidade digital e possibilidades de interatividade com a internet. As necessidades tecnológicas e de mercado são apenas a ponta do iceberg. A luta pela democratização da informação e a proliferação de rádios comunitárias aponta para um caminho muito mais amplo de novas perspectivas, linguagens e necessidades. O rádio no Brasil completa oitenta anos sem envelhecer, muito pelo contrário, está a cada dia mais rejuvenescido.

A Rádio Nacional, lembra-se?

Uma estação de rádio, com um elenco maior do que o de qualquer emissora de televisão no Brasil. Você tem mais de 25 anos? Então ela faz parte de sua vida

Sérgio Cabral
Extraído da revista Realidade, n. 75
São Paulo, Abril, junho de 1972


Praça Mauá, nº 7, Rio de Janeiro. Sábado, 14h 58. Dentro de dois minutos estará no ar o maior programa de todos os tempos do rádio brasileiro. A Rádio Nacional transmite alguns anúncios, depois de ter apresentado o Consultório Sentimental, de Helena Sangirardi, e a reprise do Balança, Mas Não Cai, cuja audiência de 35 pontos no Ibope é incrível, tendo em vista que o programa foi apresentado ontem à noite.

O auditório de pouco mais de seiscentos lugares está superlotado. No mínimo, umas mil pessoas aguardam ansiosas o início do programa. Seu apresentador e principal responsável, César de Alencar, acerta com um dos produtores, Hélio do Soveral, os últimos detalhes para que tudo ocorra bem. A orquestra, com os integrantes todos sentados e o maestro Chiquinho, com seu enorme lenço no bolsinho de cima do paletó, preparado para comandar os primeiros acordes do prefixo do Programa César de Alencar.

No ar, o último jingle comercial: é a valsa do Phimatosan, composta por Lourival Marques, que retirou a melodia de uma música européia do século passado (séc. XIX). O operador acende a luz vermelha indicando que, dentro de quinze segundos, estará no ar o Programa César de Alencar. Milhões de aparelhos de rádio, em todas as cidades brasileiras, do Amazonas ao Rio Grande do Sul, estão ligadas, oferecendo uma audiência esmagadora. Aliás, o ponteiro desses aparelhos poucas vezes sai da Rádio Nacional.

Hoje também é dia do jogo Vasco e Flamengo, o clássico dos milhões, reunindo as duas maiores torcidas cariocas no estádio do Maracanã. Todas as estações de rádio do Rio de Janeiro, até algumas de outros Estados, estão no Maracanã, para transmitir a partida. Menos a Rádio Nacional, líder também de audiência na transmissão esportiva: sábado à tarde, pode haver jogo da Seleção Brasileira, que a Nacional não deixa de transmitir o Programa César de Alencar.

"Alô, alô, alô. Boa tarde, ouvintes; boa tarde, auditório. Agradeço a sua presença no auditório, sem a qual não faria nem a metade de nosso programa. A primeira parte do Programa César de Alencar é aquela que leva a chancela das meias Dixon - conforto e durabilidade. Fabricada em Juiz de Fora, porem à venda em todo o Brasil. Para abrir a parte musical, aí veio a mais recente contratação da Rádio Nacional: Jorge Veiga!"

O sambista surge com seu terno branco de linho S-120, sapatos de verniz, em meio a uma impressionante gritaria do auditório. E, como de hábito, antes de cantar a sua música, dirige-se aos aviadores:

- Alô, alô, aviadores do Brasil. Aqui fala Jorge Veiga, da Rádio Nacional. Queiram dar os seus prefixos para guia das nossas aeronaves. (...)

Uma fortaleza voadora da Força Aérea Brasileira, com catorze pessoas a bordo, depois de atravessar a selva amazônica, tentava pousar no aeroporto de Campo Grande (Mato Grosso*), que estava inteiramente às escuras. Eram 11h15 da noite, quando seu comandante conseguiu comunicar-se com a Base Aérea de Santa Cruz, no Rio de Janeiro, à qual transmitiu o drama que estava vivendo.

Um dos oficiais da Base, que recebeu a comunicação, telefonou imediatamente para a Rádio Nacional e, minutos depois, um locutor transmitia uma mensagem para Campo Grande, uma cidade distante 2000 quilômetros do Rio de Janeiro: "Atenção, Campo Grande; atenção, Campo Grande, em Mato Grosso. Uma fortaleza voadora da FAB precisa aterrar. O campo de pouso está às escuras. Atenção, Campo Grande, Mato Grosso". Às 23h45, o avião pousava no aeroporto iluminado pelos faróis de dezenas de automóveis que ouviram o apelo da Rádio Nacional.

Referências:

Site do Grupo de Profissionais do Rádio do Rio de Janeiro.
Rádio Companheiro por Helena Aragão. Reportagem publicada em 01/01/2003 às 10h00. Fonte: Verso Brasil Editora - editora@versobrasil.com.br
http://www.preserveoam.hpg.ig.com.br/nacional.htm

Linkografia

A discussão acerca do rádio e a sua linguagem não se encerram nas palestras da Semana do Rádio. Os links abaixo podem servir como fonte de informação e pesquisa.


Bibliografia

Se você ficou interessado no assunto e quer se aprofundar mais na linguagem do rádio, na sua história e acontecimentos, seguem duas listas de referências bibliográficas que poderão te ajudar bastante. Que fique claro, esses não são os únicos livros sobre o assunto, mas com certeza vão te proporcionar informação de excelente qualidade.

Essa primeira lista são de livros que podem ser encontrados nas melhores livrarias:
  • A Informação no Rádio - Os Grupos de Poder. Ortriwano, Gisela Swetlana / SUMMUS
  • Produção de Rádio. Mcleish, Robert / SUMMUS
  • Jovem Pan - A Voz do Rádio. Faria, Álvaro Alves de / RG EDITORES
  • Rádio : 24 Horas de Jornalismo. Parada, Marcelo / PANDA BOOKS
  • Rádio no Brasil: Tendências e Perspectivas. Bianco, Nélia R. Del / UNB
  • Rádio Comunitária Não É Crime. Coelho Neto, Armando / ICONE
  • Rádio e Política: do Microfone ao Palanque. Nunes, Márcia Vidal / ANNABLUME
  • Rádio : O Veículo, a História e a Técnica. Ferraretto, Luiz Artur / SAGRA-DC LUZZATTO (RS)
  • O Rádio; O Futebol e a Vida. Araujo, Flavio / Senac São Paulo
  • A Bola no Ar Vol. 45 - O Rádio Esportivo em SP. Soares, Edileuza / SUMMUS
  • A Era do Rádio - Descobrindo o Brasil. Calabre, Lia / JORGE ZAHAR
  • A Notícia na Rádio Gaúcha. Klockner, Luciano / SULINA
  • Histórias de Gente do Rádio. Gramático, Dáurea / IBRASA
  • Comédias do Coração e Outras Peças para Rádio e Tv. Silva, Carmen / AGE
  • Programa Casé - O Rádio Começou Aqui. Casé, Rafael / MAUAD
  • Revista do Rádio - Col. Arenas do Rio. Faour, Rodrigo / RELUME DUMARA
  • Projetos de Sistemas Rádio. Miyoshi, Edson Mitsugo / ERICA
  • Como Falar no Rádio. César, Cyro / IBRASA

A segunda lista foi encontrada e selecionada do sistema Minerva da UFRJ e a grande maioria dos livros relacionados está disponível das bibliotecas da ECO e do CFCH.
  • Rádio Nova. Oliveira, Ivana Bentes. coord.
  • Rádio nacional. Saroldi, Luiz Carlos.
  • Por trás das ondas da Rádio Nacional. Goldfeder, Miriam.
  • Rádio online. Santos, Isabel Cristina Spagnolo dos.
  • A Informação no Rádio. Ortriwano, Gisela Swetlana.
  • Manual de Radiojornalismo Jovem Pan. Porchat, Maria Elisa.
  • ABC do Rádio Moderno. Salm, Walter G.
  • A Bola no Ar. Soares Edileuza
  • Rádio Escuta. Lilian, Zaremba.
  • Radiografia. Barbosa, Fernando Antônio Mansur.
  • No tempo de Almirante : uma historia do Radio e da MPB. Cabral, Sergio.
  • Rádio. Mello, Veridiana Pivetta de.
  • Você, ouvinte, é a nossa meta. Guerra, Márcio de Oliveira.
  • 87,9 : A universitária está no ar. Americano, Álvaro Eduardo Trigueiro.
  • Da clandestinidade à legalidade. Costa Júnior, Achylles de Oliveira.
  • Setenta anos de rádio em Campos. Tavares, Andral Nunes.
  • Rádio comunitária de Angónia. Namburett, Denise.
  • Dramaturgia da informação radiofônica. Sanz, Luiz Alberto
  • Terra livre. Torrescasana, Mariângela Alvers Storniolo.
  • A radioteca jovem em questão. Moraes, Mônica Cristina de.
  • No ar "o som das águas", um projeto radiofônico. Silva Neto, Casemiro.
  • Da era do rádio aos dias atuais. Viana, Ditinha.
  • O amigo da madrugada. Herd, Erika Franziska.
  • O escritor, a comunicação e o radiojornalismo (cadernos de apontamentos). Araújo, Carlos Brasil de.
  • A Rádio Relógio Federal, um meio quente de comunicação de massa. Feijó, Luiz Cesar Saraiva.
  • Audience ratings. Beville, Hugh Malcolm.
  • The radio & television commercial. Book, Albert C.
  • An African Experiment in Radioforums for Rural Development. UNESCO
  • Aspects du discours radiophonique. Bauer, C.
  • La Radio como Instrumento de Desarrollo Rural. Torre, Asdrubal de La.

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